03 a 07 de junho de 2019, Rio Branco - AC
O CENÁRIO ROCK UNDERGROUND EM RIO
BRANCO – ACRE A PARTIR DA REALIZAÇÃO DO EVENTO FELIZ METAL[1]
Maria de Fátima Bandeira de Souza[2]
RESUMO
Este
artigo trata-se de uma abordagem inicial a respeito do cenário do rock na
cidade de Rio Branco, Acre, tendo como foco a realização do ‘Feliz Metal’. A
pesquisa busca discutir elementos que contribuem para a permanência desse
evento como um símbolo da cultura underground no Acre. Organizado há 15 anos,
de maneira independente, trata-se do evento musical com maior permanência no
Estado e volta-se, principalmente, para a divulgação de bandas fora da grande
mídia e do cenário musical em geral. Para melhor compreensão do tema proposto,
recorre-se aos conceitos de underground
e tribalismo a partir dos estudos dos autores Leonardo Campoy e Michel
Maffesoli. São apresentados, de maneira breve, as características do ‘Feliz
Metal’, o uso e apropriação dos espaços de realização, as bandas participantes,
o estilo musical predominante e os significados que o evento articula.
Conclui-se que esse evento se constitui em um espaço de sedimentação da
identidade heavy metal, pois promove o intercâmbio cultural entre diversas
bandas e o público. Além disso, há a força da cena underground: o evento
incentiva a criação de novas bandas e, mesmo com pouco financiamento, ao
contrário de outros festivais realizados na cidade, o ‘Feliz Metal’ é o que
permanece há mais tempo no Acre.
Palavras-chave:
underground; tribalismo; heavy metal; Feliz Metal
UMA CENA DE
CONCEITOS
O trabalho é uma proposta de apresentar um
breve panorama do cenário musical rock no Acre. Busca-se expor essa cena
musical sob a perspectiva do Feliz Metal, evento de rock que acontece
anualmente na cidade de Rio Branco, Acre. Para isso, é necessário inicialmente,
definir os conceitos que norteiam a pesquisa, a fim de possibilitar um melhor
entendimento do objeto de estudo.
O termo que se destaca ao se falar em
cenário musical e eventos de rock pesado e suas diversas vertentes é
“underground”. O dicionário Michaellis traz algumas acepções sobre a expressão:
1. Diz-se de movimento que surgiu nos Estados Unidos
da América na década de 1960, envolvendo teatro, cinema, imprensa e literatura,
que questiona e contesta os valores culturais e sociais vigentes; udigrúdi.
2. Diz-se de peças teatrais, filmes, obras literárias
e jornais pertencentes a esse movimento; udigrúdi (MICHAELLIS, online).
Maia (2015) apresenta o conceito de
underground a partir das definições de cultura e
contracultura, por entender que o underground é uma das faces da contracultura
e é crucial abordar este elemento intrínseco.
Ao falar em cultura, Maia (2015) define
que este termo é amplo e complexo para se apresentar uma única definição.
Cultura deve ser pensada no plural, pois não existe “a cultura”, mas sim,
várias “culturas”. O conhecimento, as artes, moral, costumes, crenças, enfim,
tudo o que é produzido pelo homem faz parte da cultura.
Maia (2015) apresenta ainda a reunião dos
conceitos de cultura em âmbito sociológico e antropológico. No que concerne ao
campo da Sociologia, cultura “é um fenômeno amplo que está presente em toda a
vida social” (MAIA, 2015, p. 83), podendo se manifestar de forma material, por
meio de artefatos e objetos, ou de forma não-material, no campo das ideias,
como arte, a ética, crenças, conhecimentos, técnicas e valores. Já no campo
antropológico, leva-se em conta, também, o aprendizado do indivíduo, e a
cultura é um fator essencial na diferenciação entre os comportamentos
individuais.
Sobre
contracultura, Pereira (1988) explica que o termo foi criado pela imprensa
norte-americana, nos anos 1960, para classificar um conjunto de manifestações
culturais que estavam surgindo nos Estados Unidos e em outros países que
buscavam novas maneiras de pensar, encarar a realidade e se relacionar com o
mundo. A característica básica é a contestação à cultura vigente, uma postura
de crítica radical à sociedade: “Contracultura é a cultura marginal, independente do
reconhecimento oficial. No sentido universitário do termo é uma anticultura.
Obedece a instintos desclassificados nos quadros acadêmicos” (PEREIRA, 2015, p.
13).
Totalmente
ligado a contracultura, o underground trata-se de uma cultura que não está
preocupada em seguir modismos, padrões comerciais, e que se coloca contra a
fama, o lucro e a grande visibilidade midiática. Manifesta-se na música, nas
artes plásticas, na literatura. Segundo Hugo Ribeiro (2004):
A partir dessa definição, as bandas de rock
underground são aquelas que não participam diretamente de grandes eventos
midiáticos, sendo quase sempre marginalizadas pela mídia e sociedade em geral,
desenvolvendo dessa forma, uma rede própria de comunicação e divulgação, e uma
cena alternativa (RIBEIRO, 2004, p. 2).
Heavy
metal, ou “metal pesado”, refere-se ao gênero derivado do Rock N’ Roll, com
guitarras distorcidas, batidas pesadas e vocais poderosos. Esse termo, segundo
Nogueira (2003)[3], apareceu na música pop
pela primeira vez em Born to be wild,
da banda Steppenwolf, em 1968, ainda que o verso “heavy metal thunder” (trovão
de metal pesado), não se refere às guitarras, mas ao barulho das motocicletas.
Mas o
heavy metal não é apenas um gênero musical. Esse estilo, então, vai muito além,
pois manifesta-se por meio de roupas, poses, atitudes, nas letras de músicas,
nos ritmos, na performance das bandas e no envolvimento prático com os fãs.
Estes últimos não são apenas consumidores de música, mas tornam-se produtores
de heavy metal, compondo músicas, produzindo show e transmitindo gravações.
“Constituinte de grupos locais e produtor de estéticas sonoras, ele faz do heavy metal uma ação social e um modo de
inserção na cidade” (CAMPOY, 2010, p. 23).
Outra característica do heavy metal
é sua segmentação. Campoy (2010) prossegue afirmando que é impossível
especificar toda a miríade de sub-gêneros do heavy metal: há o trash metal,
metal progressivo, power metal, black metal, death metal, doom metal,
gore/grind, entre tantos outros. Todos representam variáveis estilísticas
apresentadas pelas bandas. A diferença está na intensidade do som, na
utilização dos instrumentos, nas diversas influências, nas letras e nos
elementos apresentados nas músicas.
Mas tudo é underground, uma organização específica de
mercado e de indústria da música que se deseja oculta na vida urvana, sempre a
definir-se contra um inimigo externo: o mundo inautêntico e corrompido de modo
geral contra o qual se combate (CAMPOY, 2010, p. 14).
Devido à própria organização do
evento Feliz Metal, que conta com a participação de várias bandas do segmento,
apresenta-se o conceito de heavy metal extremo, a partir dos estudos de Campoy
(2010).
À
primeira vista, o gênero musical abordado repele os não-aficionados. Esse é um
efeito desejado e explícito da ideologia que o acompanha. O metal extremo
produz um som pesado, isto é, radicaliza a elaboração artística de uma
sonoridade brutal e acelerada, da afinação distorcida, do vocal gutural; vem
acompanhado de um imaginário que estiliza o mal, o abjeto, o horror (CAMPOY,
2010, p. 13).
O UNDERGROUND E O TRIBALISMO
Maia
(2015) destaca a questão da sociologia do cotidiano. Tomando como pressuposto
que o cotidiano refere-se não apenas a algo rotineiro vivenciado no tempo e no
espaço pelos indivíduos, a autora traz as reflexões de Michel Maffesoli (1995)
segundo o qual o cotidiano não pode ser entendido como um conceito, mas como um
estilo, por ser mais abrangente.
[...] De tudo o que foi dito, deve-se lembrar
que o estilo pode ser considerado, stricto sensu, uma ‘encarnação’ ou
ainda a projeção concreta de todas as atitudes emocionais, maneiras de pensar e
agir, em suma, de todas as relações com o outro, pelas quais se define uma
cultura. (MAFFESOLI, 1995, p.64, apud
MAIA, 2015, p. 67)
O conceito de cultura, já citado aqui, é algo inerente para se
entender o cotidiano. Maia (2015) fala que as questões emocionais presentes nas
trocas entre o indivíduo e o outro são importantes, remetendo à alteridade, ou
seja, o diferente, “considerar a existência de alguém que está na outra ponta,
responsável por completar essa relação de troca social” (MAIA, 2015, p. 67).
A partir
da obra de Maffesoli, dois conceitos podem ser destacados para se compreender
melhor o objeto de estudo: socialidade e tribalismo. O primeiro refere-se ao
“estar-junto” de forma espontânea, ou seja, os grupos sociais, como
característica principal da pós-modernidade, não estão mais vinculados entre si
por contratos ou normas estabelecidas, mas sim por um sentimento em comum.
Hábitos, ideologias, costumes, motivações que estão no consciente de cada
indivíduo passam a se manifestar no coletivo.
De
maneira quase animal sentimos uma força que transcende as trajetórias
individuais, ou antes, que faz com que estas se inscrevam num grande balé cujas
figuras, por mais estocásticas que sejam, no fim das contas, nem por isso
deixam de formar uma constelação cujos diversos elementos se ajustam sob forma
de sistema sem que a vontade ou a consciência tenham nisso a menor importância.
É este o arabesco da socialidade (MAFFESOLI, 1998, p. 107).
Atrelado à socialidade, apresenta-se o termo
tribalismo. Com o “declínio do individualismo” apontado pelo autor, os grupos
sociais emergem como o lugar de inserção e permanência do indivíduo na
coletividade. Dotados de coesão, partilha de valores, lugares e coerência nos
ideais, esses grupos se organizam, defendem e contestam o que não está de
acordo com o sentimento compartilhado. A partir desse termo entende-se também a
questão do underground, presente nos eventos de metal extremo. A fala de Victor
Michael Santos, um dos primeiros organizadores do Feliz Metal, retrata isso:
O underground é um
movimento que é muito coeso, muito sólido e caminha diferente do que as pessoas
imaginam que ele é. Tipo o underground não almeja ser o mainstream, o underground almeja ser coeso, autossustentável,
fomentar essa contracultura, em todos os sentidos, não só na música, é no
estilo de vida, são nas publicações que a gente tem, são os zines[4],
que são as revistas, são os blogs, são as distros que fazem o papel de
distribuir, de fazer circular o material das bandas, enfim. O underground não
busca essa fama, esse sucesso que as pessoas imaginam que sejam o ponto final
do underground. Nós estamos aqui hoje desconhecidos, mas não queremos ser um
Iron Maiden. Nós temos nossas influências, mas não necessariamente queremos ser
eles (SANTOS, 2019, entrevista).
A partir
das reflexões de Maffesoli (1998), pode-se entender o Feliz Metal como um
espaço onde se desenvolve a cena underground do Acre. Há a constituição de uma
“tribo”, em que os valores e ideias fazem parte de um todo coerente. Não há
espaço para o banal e efêmero, a cena underground é forte, rica e complexa.
É
para dar conta desse conjunto complexo que proponho usar, como metáfora, os
termos de “tribo” ou de “tribalismo”. Sem adorná-lo, cada vez, de aspas,
pretendo insistir no aspecto “coesivo” da partilha sentimental de valores, de
lugares ou de ideais que estão, ao mesmo tempo, absolutamente circunscritos
(localismo) e que são encontrados, sob diversas modulações, em numerosas
experiências sociais (MAFFESOLI, 1998, p. 28).
A
contestação como característica do underground e pode-se dizer também do
tribalismo de Maffesoli, uma vez que é importante para a sobrevivência da
“tribo” é um elemento fortemente presente no Feliz Metal e na cena heavy metal
acreana. De acordo com Victor Michael, inicialmente a ideia era apenas fazer um
evento em que todos podiam participar. No entanto, com o passar do tempo,
conforme complementa Ricardo Costa foi necessário delimitar o posicionamento
político e religioso do evento.
“A busca sombria por uma totalidade
estilizada pelo metal extremo só será percebida como verdadeira pelos
praticantes se for empreendida no âmbito do underground” (CAMPOY, 2010, p.
239). Victor Michael Santos fala que são posicionamentos naturais do heavy
metal estar contra religiões que mataram, contra intolerâncias políticas,
discriminação e elitização. Dessa forma, conforme também complementa Ricardo
Costa, o evento possui um posicionamento político de esquerda e não há mais a
apresentação de bandas cristãs.
Dentro desse movimento, convivemos com
pessoas que são usuárias de drogas ilícitas, que não são praticantes de
religiões consideradas oficiais. São ateus, pessoas da umbanda, do candomblé,
ou que seguem o satanismo filosófico. E essas pessoas, consideradas minorias,
são execradas, sempre foram perseguidas por outros que se dizem cristãos, e que
viram no heavy metal, com muito público, muitos jovens, uma oportunidade de vir
e doutrinar. E tirar essa liberdade dessas pessoas, de pensar, de existir, de
se afirmar. O heavy metal é um lugar, é um palco, um zine, um cd, enfim, onde
nós temos nosso espaço de manifestação pública. Não seria coerente da nossa
parte compactuar, abrir um espaço que foi conquistado com tanta dificuldade com
quem sempre oprimiu a gente (SANTOS, 2019, entrevista).
Atitudes
e ideias, posicionamentos políticos e religiosos agora são selecionados. Isso
pode ser verificado na concepção de Campoy (2010), em que este diz que o
underground busca uma autenticidade. Papéis não podem ser encenados,
constrangimentos não podem ser suportados, pois o indivíduo é dono de si. Sua
verdadeira subjetividade se sincroniza com a objetividade das relações sociais.
Além disso, pode-se pensar, a partir
dessas reflexões, o Feliz Metal como um evento significativo para o público,
pois é o momento em que o “consumidor passivo” tem acesso às bandas locais e o
heavy metal é “injetado” em suas veias. Todos os elementos consolidam-se no
show.
(...) o circuito só terá significado se
ele confluir para o emanar do show. Para o praticante, o underground como um ‘todo orgânico’ só é vivenciado neste evento.
Pensando junto com eles, é no show que a “chama do underground” é acesa e é no show que ela brilhará com a maior
intensidade (CAMPOY, 2010, p. 255).
O FELIZ METAL EM
CENA
O Feliz Metal é um evento beneficente de
heavy metal que acontece anualmente em Rio Branco, Acre, voltado para o rock
pesado e suas diversas vertentes. O festival nasceu em 2004, a partir de um
grupo de seis amigos, que eram músicos e produtores: Ricardo Costa
(Ricardinho), Roberto Padula (Bala), Igor Alves, Victor Michael Santos, Saulo
Barros e Fábio Ferreira (Kill). Este grupo formou a Dream Cry Produções
Artísticas.
Pode-se
dizer que a ideia do Feliz Metal “surgiu após muita cerveja”: Ricardo Costa,
atual produtor, e Victor Michael Santos, explicam que o grupo se reunia
constantemente para beber cerveja, fazer churrasco e ouvir heavy metal.
Inicialmente, como uma brincadeira, logo veio a ideia de vender as latas de
cerveja e utilizar o dinheiro para uma festa.
Era
mais uma reunião de uma galera que bebia, ouvia som junto, e reunia muita
gente, na casa de alguém ou aqui na antiga CUT, na frente da casa do
Ricardinho. Tinha o estúdio do Bala, que todas as bandas da cidade ensaiavam
(...). A gente pensou “vamos juntar essas latas que a gente tá bebendo, fazer
uma festa”. Meio de brincadeira, mas a história foi levada a sério e acabou que
na época o alumínio estava bem valorizado. Deu uma quantia de dinheiro que a
gente não esperava. Vimos que tinha grana para alugar um som, alugar um local e
fazer todos os custeios de um evento. E a gente resolveu: vamos fazer um evento
(SANTOS, 2019, entrevista).
Na
época de realização de sua primeira edição, em 2004, a cena de heavy metal
estava parada, pois as bandas, tanto as novas como as antigas, que ainda
existiam, não tinham espaço para tocar. Mas já havia uma cena bem antes do
surgimento do evento. Michael prossegue:
Havia uma cena antes da nossa. Eu costumo falar e
pensar na cena do Feliz Metal como a segunda geração do metal ou do rock n’
roll, dessa cena aqui do Acre. Porque antes tinha uma galera, a qual o Igor da
PI faz parte, o Franciscarlos CI, uma galera que é mais antiga que ouvia som e
já se reunia pra conversar, compartilhar cassete, vinil e participava dos
festivais (SANTOS, 2019, entrevista).
Figura 1 – Cartaz de divulgação da
primeira edição do Feliz Metal
Dessa forma, o primeiro Feliz Metal foi
realizado na SBORBA, com a participação de cinco bandas acreanas e um grupo
teatral. A entrada era possível mediante a doação de um quilo de alimento não
perecível, que seria entregue a famílias carentes. O evento possui também um
cunho beneficente que se mantém desde sua primeira edição.
Sobre o cunho beneficente, outra atividade
com intuito solidário é realizada juntamente com o Feliz Metal. Além da
arrecadação durante o evento, é realizado o Arrastão Solidário, em que, segundo
Ricardo Costa, vários motoclubes de Rio Branco saem em um passeio pela cidade,
arrecadando alimentos e roupas. O encontro passou a fazer parte do evento em
sua quinta edição, em 2008.
Figura
2 – Público presente no primeiro Feliz
Metal (Foto: Roberto Padula)
Segundo
Victor Michael Santos, a primeira edição teve bastante público. A partir daí, o
grupo de amigos viu que havia potencial para se realizar o evento todos os
anos. Até sua terceira edição, havia a arrecadação das latinhas, mas o Feliz
Metal também teve apoios dos próprios amigos que gostavam do evento, patrocínio
de empresas privadas e participação em editais de incentivo à cultura.
O segundo Feliz Metal teve a participação da banda
Steel Warrior, a gente já tinha comprado as passagens e a princípio tivemos um
projeto aprovado em uma empresa privada. Mas no final a empresa decidiu não
financiar. Deu um prejuízo muito grande. E os demais, a maioria na verdade,
quando não tinha projeto de financiamento aprovado, os amigos se reuniam pra
fazer (COSTA, 2019, entrevista).
Em
2018, o Feliz Metal chegou à sua décima quinta edição. Todos os anos
anteriores, desde sua criação, foram realizadas edições, inclusive uma
especial, contando com a participação de bandas do cenário heavy metal acreano,
mas também de outros estados e países. Sua realização é um esforço coletivo das
pessoas que fazem parte do cenário e gostam do gênero e, por conta de sua
permanência, durante quinze anos, tornou-se o único festival de música com
maior tempo de atividade no Acre.
Até
2019, são 15 edições, todas realizadas no dia 25 dezembro, além da edição
especial que aconteceu no dia 27 de abril de 2018, e que comemorou 15 anos de
existência do evento. Na oportunidade a banda Miasthenia foi a grande atração
da noite. 53 bandas já passaram pelo evento, sendo: 17 de outros Estados
Brasileiros, 02 atrações internacionais e 01 atração do interior do Acre (DREAM
CRY, 2019, online).
Além
da SBORBA, o Feliz Metal foi realizado em diversos espaços da cidade. Ricardo
Costa cita a antigas boates Lua Azul e 14 BIS, a Concha Acústica e Studio Beer,
onde, desde 2017, é promovido. O organizador explica que não existiam locais de
fato do heavy e muitos desses espaços quase não estavam sendo utilizados, logo
o grupo foi se apropriando. Em muitas das suas edições não era cobrado
ingresso, mas, após sua última edição na Concha Acústica (em 2016) e como forma
de auxiliar no custeio do evento, há a cobrança de ingresso.
A
tabela a seguir apresenta todas as bandas que participaram do Feliz Metal. É
importante destacar que os grupos musicais que não são originários na cidade de
Rio Branco, possuem a identificação do seu local de origem.
Bandas
participantes do Feliz Metal
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1ª Edição – 2004
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Lona Blues Boys (Rock e Bues);
Soldier (Heavy Metal); Fire Angel (heavy metal tradicional/melódico); Silver
Cry (Heavy Metal); Dream Healer (Heavy Metal)
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2ª Edição – 2005
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Silver Cry; Soldier; Bedroyt –
Porto Velho/RO (Hard Rock/Heavy Metal); Steel Warrior – Itajaí/SC (Heavy
Metal)
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3ª Edição – 2006
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Survive (Death/Metalcore); Silver
Cry; Dream Healer; Fire Angel (Heavy Metal tradicional/melódico); Sortilégio
– Porto Velho/RO (estilo); Incinerador – Porto Velho/RO (Death Metal)
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4ª Edição – 2007
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Survive; Silver Cry; Dream Healer;
Crystal Lake – Leme/SP (Trash Metal)
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5ª Edição – 2008
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Survive; Silver Cry; Dream Healer;
Fire Angel; Wildchild (Death/Speed Metal); Mártires (Death/Core); Metal Live
(Heavy Metal); Raw Ride (Heavy Metal); Zebulom (Death/Trash Metal); Scalpo (Crossover/Trash
Metal); Soldier; Suicide Spree (Death/Trash Metal); Bedroyt - Porto Velho/RO
(Hard Rock/Heavy Metal); Torture Squad – São Paulo/SP (Death/Trash Metal).
|
6ª Edição – 2009
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Survive; Silver Cry; Raw Ride;
Suicide Spree; Seventy Hills – Cruzeiro do Sul/AC (Heavy Metal); Bedroyt –
Porto Velho/RO; Sortilégio – Porto Velho/RO (Heavy Metal); Fates Prophecy –
São Paulo/SP (Heavy Metal); Korzus – São Paulo/SP (Trash Metal)
|
7ª Edição – 2010
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Kindom of Steel (Heavy Metal); Fire
Angel; Raw Ride; Suicide Spree; Claustrofobia – São Paulo/SP (Metal)
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8ª Edição – 2011
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Maria Joana (Rock N Roll); Scalpo;
Silver Cry; Discórdia (Grindcore); Guerrilla P.A. 44 (Mincecore/Grind); Raw
Ride; Fire Angel; Suicide Spree; Pastore – São Paulo/SP (Heavy Metal)
|
9ª Edição – 2012
|
Scalpo; Discórdia; Fire Angel;
Morte Lenta – Porto Velho/RO (Black Metal); Apokalyptic Raids – Rio de
Janeiro/RJ (Black/Death/Trash Metal)
|
10ª
Edição – 2013
|
Wall Of Death W.O.D (Trash Metal);
Discórdia; Morte Lenta – Porto Velho/Rondônia; Nylon Maiden/Thomas Zwijsen –
Holanda (Heavy Metal); Blaze Bayley – Inglaterra (Heavy Metal)
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11ª Edição – 2014
|
Headless (Heavy Metal); Death
Silence (Death Metal); Chaos AC (Trash Metal); Metal Jacket (Hard Rock/Heavy
Metal); Turbo Aggressor – Porto Velho/RO (Heavy Metal); Dark Avenger –
Brasília/DF (Heavy Metal)
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12ª Edição – 2015
|
Lost Cause (Trash Metal); Death
Silence; Born Hell; Road Wolf (Hard Rock, Heavy Metal); Fire Angel; The
Classics (Rock Clássico)
|
13ª Edição – 2016
|
Condado Frank Oliver (Country/Punk
Rock); NoMás (Grindcore/Noise/Crust/Mincer; Metal Jacket; Necromantticu (Black/Death
Metal); Hylidae (Death/Trash Metal); Death Silence; Born Hell (Black/Trash
Metal)
|
14ª Edição – 2017
|
Condado Frank Oliver; NoMás; Metal
Jacket, Necromantticu; Hylidae; Death Silence; Born Hell
|
Edição especial – 27 de abril de
2018
|
NoMás; Metal Jacket; Necromantticu;
Hylidae; Death Silence; Miasthenia – Brasília/DF (Extreme Pagan Metal)
|
15ª Edição – 2018
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NoMás; Discórdia; Hylidae; Death
Silence; PHC – Porto Velho/RO (Punk Hardcore); Aggresion – Campo Grande/MS (Metal)
|
As informações referentes ao gênero[5] de
cada banda foram extraídas dos sites ou redes sociais de cada uma delas, da
entrevista realizada com Ricardo Costa e pelo blog da Dream Cry Produções.
A partir da observação da tabela,
verifica-se que o Feliz Metal, desde sua primeira edição, apresenta uma
predominância de bandas de heavy metal extremo. Quanto a isso Campoy (2010)
fala:
O que denominamos de metal extremo baseia-se nisso que
Maurício chama de “coisa mais pesada”. Como ele mesmo me explica: “é esse metal
mais brutal, mais rápido [...], é death,
black, trash, grind, splatter, doom, enfim, esse tipo de som”. Mas
Maurício, é mais pesado, é mais brutal, mais rápido em relação a quê? “Cara, em
relação a esse metal mainstream,
cheio de solo, gritinho agudo e firula [...], é metal, mais um outro tipo de
metal, mais extremo” (CAMPOY, 2010, p. 30-31).
Um dos questionamentos que podem ser
levantados ao se conhecer o festival é a sua realização na época natalina. Ricardo
Costa considera que já é algo da cultura acreana saber que, no dia 25 de
dezembro, geralmente às 17 ou 19 horas, se estendendo até a noite, é realizado
o Feliz Metal. Para a resposta, já entra em cena uma das características do
underground: o seu caráter contestador. O músico fala que o evento não é uma
homenagem ao Natal, mas é uma forma também de contestá-lo, uma afronta. Isso
também se refletiu nas artes que se tornaram mais “agressivas”.
Outro aspecto é citado pelos
organizadores. A partir do Feliz Metal muitas bandas surgiram no Acre. Victor
Michael Santos também explica que antes não havia lojas especializadas, um
público consumidor da música que é produzida aqui, mas, a partir do momento em
que o evento foi sendo organizado, se consolidando, o cenário de heavy metal
foi se expandindo.
As pessoas começaram a fazer questão de estar no
evento, de comprar um CD, de comprar uma camisa, de se interessar por essa
cultura, pela cultura do rock pesado. E existe uma geração hoje que são os
filhos do Feliz Metal. São pessoas que tocam como a gente, que produzem. E as
pessoas que são mais novas, que nem viram a primeira, a terceira edição, mas
que hoje são público, que fazem questão de participar (SANTOS, 2019, entrevista).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta
pesquisa apresentou, de maneira breve, o Feliz Metal e os significados que este
evento articula a partir dos conceitos de underground e tribalismo, definições
atreladas às questões de cultura e contracultura, essenciais para se entender a
importância do evento no Estado.
Conclui-se
que a constituição do cenário do gênero heavy metal no Acre deve bastante a
realização do Feliz Metal. Sua permanência durante quinze anos possibilitou que
uma cultura underground se sedimentasse, unindo pessoas, bandas, produções,
ideias, dinâmicas identitárias, entre outros elementos que fazem parte desse
universo.
Por
se tratar de uma primeira abordagem sobre o heavy metal no Acre, esta pesquisa
deixa lacunas, mas que devem ser preenchidas em estudos posteriores. Algumas
reflexões nasceram durante o processo de elaboração deste trabalho, em
conversas com as pessoas envolvidas e a partir das leituras empreendidas.
O
Feliz Metal é o evento que permanece há mais tempo no Estado, mas não é o único
do gênero que é realizado em Rio Branco. Porém, é reconhecido pelas pessoas
envolvidas como o que atrai mais público.
Além
disso, outros festivais de reconhecimento realizados em Rio Branco como, por
exemplo, o Festival Varadouro, o Festival Acreano de Música Popular (Famp), o
Festival Chico Pop, que obtiveram um financiamento para serem promovidos, não
permanecem até hoje. O Feliz Metal, com pouco financiamento busca, pelas
pessoas envolvidas, continuar como ‘tradicional’.
A experiência de pesquisar sobre o
Feliz Metal possibilitou entender como é constituído o universo do heavy metal
no Acre, mas entende-se que há mais questões que podem ser aprofundadas. Nesse
sentido, a pesquisa é uma contribuição e buscou abrir caminho para se pensar,
registrar e analisar outros elementos da cultura acreana.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
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no Brasil. São Paulo: Alameda, 2010.
COSTA,
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DREAM
CRY. Feliz Metal – Atitude e Solidariedade – Dream Cry Produções. 2019.
Disponível em: < https://felizmetal.blogspot.com/2019/04/felizmetal-um-festival-de-musica.html>. Acesso em: 02 mai. 2019.
FERREIRA,
Fábio Gonçalves de Carvalho. Sexo, drogas e roko-loko: a representação social
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revista Rock Brigade. Monografia (Graduação em Jornalismo) – Centro de
Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Acre. Rio Branco. 2014.
MAFFESOLI,
Michel. O tempo das tribos: o declínio do individualismo nas sociedades de
massa. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998.
_____.
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1995.
MAIA,
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NOGUEIRA,
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PEREIRA,
Carlos Alberto M. O que é contracultura? São Paulo: Brasiliense, 1988.
RIBEIRO,
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Aracaju-SE. In: V Congresso Latinoamericano da Associação Internacional para o
Estudo da Música Popular, IASPM-LA, Anais, 2004.
SANTOS,
Victor Michael. Entrevista concedida a Maria de Fátima Bandeira de Souza. 2019.
UNDERGROUND.
Dicionário online Michaellis. Disponível em: < https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/underground/>. Acesso em: 26 mai. 2019.
[1] Trabalho apresentado no GT 6 –
Estudos Interdisciplinares da VIII Semana Acadêmica de Comunicação – Seacom
2019, realizada de 3 a 7 de junho de 2019.
[2] Jornalista graduada pela
Universidade Federal do Acre. Email: m.fatima.bandeira@gmail.com.
[3]
Disponível em <https://super.abril.com.br/cultura/de-onde-vem-o-termo-heavy-metal/>.
[4] Zine ou Fanzine é uma publicação
independente produzida por fãs de uma cultura em particular. “Trata-se de
publicação alternativa movida pela paixão de criar, não possuindo pretensões
financeiras, editam em suas páginas desde críticas literárias, musicais e
cinematográficas, até contos, poemas e quadrinhos” (FERREIRA, 2015, p. 22).
[5] Esta pesquisa não se prolongará na
descrição minuciosa de cada subvertente do gênero heavy metal, visto que foge
aos objetivos do trabalho. Para isso, recomenda-se a leitura da obra de
Leonardo Campoy (2010), Trevas sobre a
Luz: o underground do heavy metal extremo do Brasil.