Pensei em voltar aos velhos tempos e fazer uma resenha do VI Feliz metal, ocorrido em Rio Branco no último dia 25 de Dezembro. Mas estou tão afastado da cena de heavy metal (embora ainda respire o estilo e o sinta batendo forte em meu coração metálico) que não me senti capaz disso. Então, resta-me fazer como fiz ainda em 2001, quando realizei o primeiro Choose Your Side Festival em Minas Gerais, uma resenha sem a intenção de ser profissional, apenas um relato baseado nas impressões pessoais sobre o evento.
Então, primeiro algumas considerações sobre o Feliz Metal. Primeiro que tenho muito orgulho de ter feito parte da equipe que iniciou o projeto e de direta e indiretamente ter contribuído para sua realização. Jamais esquecerei a amarga dívida que contraí com a vinda do Steel Warrior na segunda edição do evento, mas também jamais me esquecerei da satisfação de pagá-la com o suor de meu trabalho, pois em um mundo onde o capitalismo predomina (inclusive no metal), saber que algo ainda é feito com intenções sem fins lucrativos e pelo puro amor é algo que somente alguns privilegiados podem compreender. Assim, minha contribuição direta para a terceira edição foi apenas a quitação de minha parte da dívida, mas tenho certeza que dali para frente contribui indiretamente com o sucesso do projeto. Também não me esqueço da dose de profissionalismo que sempre tentei injetar nas bandas do Acre, das cobranças por material próprio e pela divulgação além-Acre. E por isso, mesmo não tendo mais ligação direta com o festival, sinto-me orgulhoso por acreditar que de alguma forma influenciei (ao menos um pouco) esta nova perspectiva e sucesso, sem é claro, tentar trazer para mim os méritos dos que continuaram após minha saída, e que estes sim, foram diretamente responsáveis pelo que temos hoje, um grande evento, inter-estadual e profissional. Senão vamos comparar, se pegarmos eventos do mesmo porte em outros estados, quantos deles podem trazer as bandas de tão longe de casa? E mais, de avião? E não só a banda, mas também a necessária equipe de apoio? Quantos destes eventos possuem dois palcos para que quando uma banda termine a outra já esteja pronta para prosseguir com o espetáculo?
É claro que há problemas e dificuldades. Aliás, estas últimas imensamente maiores que em outros estados. E digo isso não na perspectiva de alguém que imagina as outras cenas, mas da perspectiva de alguém que realmente conhece as outras cenas de perto, que atuou durante quase uma década no underground nacional e que, modéstia jogada para as cucuias, sabe do que está falando. E o que sei é que acabei vindo para o Acre porque sabia que havia uma lacuna a ser preenchida e queria participar da construção deste cenário, que já existia, mas que precisava de se mostrar para se desenvolver mais. Acabei não participando tanto quanto gostaria, minha vida tomou rumos totalmente distintos dos que imaginava quando cheguei ao Acre com R$1,50 no bolso. Mas fico feliz em ver que eu estava certo quando depositei no Acre as minhas fichas.
Esta edição teve presença de bandas acreanas, Rondonienses e de São Paulo. Vou citá-las não exatamente por ordem de apresentação, mas por conveniência de memória. Entre as acreanas, achei muito legal perceber novos nomes no cast, pois não se pode manter de pé uma cena que tenha apenas um ou dois nomes atuantes, é preciso constante renovação. A primeira a se apresentar foi a Suicide Spree, que em alguns momentos me lembrou algo na linha do In Flames e em outros, os veteranos do Obituary que para mim é umas das maiores referências do death metal. Achei a banda muito bem entrosada e com um imenso potencial, mas creio que a identidade ainda esteja se moldando. Realmente uma boa promessa do estado. A Seventy Hill por sua vez foi surpreendente, pois a banda não é de Rio Branco, mas de Cruzeiro do Sul, segunda mais importante cidade do estado, mas com uma ainda desconhecida tradição metálica, mesmo em Rio Branco. Boa banda, boa surpresa. Por outro lado, a Silver Cry já é bem conhecida na região, mas apresentou-se com uma formação bem diferente da que eu conhecia, tendo trazido o primeiro vocalista João Neto (Fire Angel) de volta ao posto e tendo apenas Ricardinho como remanescente da formação que acompanhei por mais tempo. Ainda em terreno acreano a Raw Ride queria e conseguiu atenção. Formada por músicos provenientes de outras bandas, como membros de antigas formações da Silver Cry e Dream Healer, fez uma apresentação legal, mas chamou a atenção para si no final da apresentação, quando colocou no palco duas garotas fazendo strip e dançando no melhor (pior) estilo axé. Na verdade, foram um pouco além do tradicional bunda-music, deixando para trás toda a roupa que vestiam... Se foi uma forma de protesto não sei, se vai criar problemas para a organização também não sei, se foi apenas curtição, idem. Se foi apenas para chamar atenção, chamou (embora não por méritos musicais). De qualquer forma, criou comoção, cada um decida o que achou. E, por fim, a Survive, banda que representou o Acre em São Paulo, na seleção do Wacken promovida pela Roadie Crew, mais uma vez mostrou que é uma das mais promissoras bandas do estado. Fazendo um Death Metal agressivo, técnico e profissional, empolgou muito.
Já as bandas de Rondônia foram Sortilégio e Bedroyt. Ambas já conhecidas na região. A primeira com um estilo calcado no death-black metal com um detalhe interessante, cantado em português. A segunda, mais na linha hard-heavy, com uma apresentação bem caricata de um guitar-hero, mas muito legal. Senti falta do vocalista Elias, que na última vez que vi a banda em Porto Velho, durante o Madeira Festival, acabou com tudo com uma apresentação à lá Ralf Scheepers. Por fim, o Fates Prophecy, de São Paulo. Já havia visto um show da banda ainda com André Boragina nos vocais e outro com Sérgio Faga, ambos muito bons shows. Infelizmente este terceiro, com o novo vocalista eu não gostei. Inicialmente por o som na apresentação do Fates Prophecy estar horrível. Não se ouvia a voz do vocalista de modo algum na primeira música. Depois melhorou, mas ainda assim a apresentação não seguiu como deveria. E assim, mesmo com uma melhora do som, continuei não gostando. Nem mesmo o clássico Pay for Your Sins e minha música preferida da banda Wings of Fire ajudaram. Entretanto, deixo o som ruim assumir a culpa pela maior parte desta má impressão, pois sei que a banda é mais do que isso. O Korzus por sua vez é outro caso, pois seu som estava infinitamente superior. Para mim, que viu a banda pela primeira vez em 1998 no saudoso Mosters Of Rock (com Megadeth, Slayer, Manowar, Dream Deather, Saxon, Dorsal e Gleen Huges) foi nostálgico. Não à toa, sempre sugeri a banda para os realizadores, são mais de 25 anos de metal... O show foi ótimo dentro de suas devidas proporções, muitos clássicos novos e alguns antigos. Só faltou mesmo um maior público e conseuqnetemente uma reação mais calorosa dos fãs, pois a banda merecia. Foram poucos os que ficaram até o final, mas quem ficou teve o gosto de ver no Acre uma das melhores e mais tradicionais bandas de heavy metal do Brasil. Há dez anos eu jamais imaginaria que isto ocorreria...
Portanto, o saldo foi muito positivo, mais um passo foi dado pela Dream.Cry, e mais uma vez um passo para a frente o que é mais importante. Méritos de quem continua na batalha como o Ricardinho e satisfação de quem atualmente só aprecia e eventualmente comenta algo realizado por outrem, como eu. Que no próximo Feliz metal mais um passo seja dado. E que venha o Blaze, se não no Feliz metal, em outro evento.